sábado, 11 de julho de 2009

JAPÃO E SUICÍDIOS



Já que o suicídio está bem incorporado nos padrões comportamentais japoneses, a prevalência do suicídio não é assunto negligenciável. As últimas estatísticas da Agência de Polícia Nacional Japonesa diz que o número em 2003 chegou a 34.427 (27,0 por cada cem mil habitantes). Para cada cem mil pessoas, no ano 2000, a taxa no Japão foi de 34,1, comparado a 10,4 nos Estados Unidos, e 4,1 no Brasil. De acordo com o Ministério da Saúde e do Trabalho Japonês, depois da segunda guerra mundial, o Japão passou por três ondas de suicídio. A primeira onda teve seu ponto mais alto em 1958, com 23.641 mortes; a segunda alcançou o máximo em 1986 com 25.667 mortes. Atualmente, estamos no meio da terceira onda, que começou em 1998. Estas ondas são observáveis não somente em termos do número, mas também em termos da taxa por cada cem mil habitantes.







A alta taxa de suicídio no Japão também tem sido assunto de muitas discussões. Muitas coisas foram observadas em relação a estas estatísticas, mas as características do gênero são particularmente merecedoras de nota. As estatísticas de suicídio claramente mostram que os homens cometem mais suicídio que as mulheres, e esta característica está sendo acentuada ultimamente. De fato, as duas últimas ondas foram quase que totalmente resultantes do aumento do número de suicídio pelos homens. Em 1980, a taxa de suicídio (o número de suicídios para cada cem mil habitantes) foi de 22,9 para os homens, e 13,3 para as mulheres. Esta taxa passou para 40,1 e 13,5 respectivamente em 2003.







Por que os homens cometem mais suicídio que as mulheres? Seria porque, como Durkheim escreveu, os homens são mais excessivamente auto-reflexivos, ou mais angustiados por necessidades ilimitadas e com menos forças regulatórias exteriores, ou, talvez simplesmente porque eles estão menos envolvidos na sociedade? (Durkheim, 1952) Suas hipóteses podem ser ainda relevantes no Japão contemporâneo. Entretanto, em certa medida, a taxa mais alta de suicídio entre os homens se deve a diferentes papéis e expectativas sociais designadas a eles.
A divisão por idade quanto à taxa de suicídio entre homens e mulheres mostra como os papéis dos dois gêneros tem uma parte importante na explicação. Homens de 50-64 anos, especialmente de 55 a 59, têm a taxa mais alta de suicídio. Mas este é um desenvolvimento bem recente, que não se observa entre as mulheres. O fato que o número de suicidas está aumentando entre homens de meia idade com problemas financeiros ressalta a responsabilidade masculina de manter a sua família, e algumas vezes os seus empregados. Esta é uma realidade ainda mais pungente em dias de dificuldades econômicas. Alguns suicídios são como uma tentativa, por parte dos suicidas, de conseguir dinheiro do seguro de vida para sua família. Um fenômeno que tem sido observado é que um dos padrões mais comuns em suicídios é que eles ocorrem quando o período de carência do seguro termina. Por outro lado, as mulheres mais ou menos na mesma faixa etária vêem seu papel relacionado com a responsabilidade de cuidar dos membros da família. A taxa de suicídio de donas de casa sempre foi muito baixo, e continua sendo. Entretanto, a taxa de suicídio entre as mulheres aumenta à medida que elas envelhecem.
A diferença de gênero na taxa de suicídio tem sido usada para documentar o tratamento injusto que os homens recebem, e para diminuir a força das denúncias das feministas que falam da opressão da mulher. Mas esta taxa também pode ser usada para substanciar a permanência dos padrões do gênero ditados pelo patriarcado. O fato que homens cometem suicídio mais que as mulheres revela uma família do tipo paternalista, em que quem ganha o pão, quem sustenta a família, está mais em risco, especialmente com o colapso do sistema de emprego vitalício.







O novo fenótipo
Porque nós estamos em uma “nação de suicídio”, o assunto do suicídio periodicamente volta à tona, graças à mídia que se aproveita para debater este assunto quando não há outros mais interessantes. Em meados dos anos 80, nós tivemos uma vasta cobertura do suicídio devido ao ijime (ser abusado por colegas mais velhos ou mais fortes) entre crianças de escola. Outras vezes, nós observamos jovens suicidas seguindo o exemplo de seu ídolo depois da cobertura massiva da mídia do suicídio de alguma figura carismática. Toda vez que a imprensa dá cobertura a tais incidentes com detalhadas informações, algumas pessoas imitam o







E a mesma coisa pode ser dita sobre as reportagens recentes sobre os pactos de suicídio ligados à Internet. Ao navegar pela database do Asahi Shinbun, um importante jornal japonês, usando palavras chave como “internet” e “suicídio”, pode-se descobrir que um incidente específico de pacto suicida primeiro ocorreu em outubro de 2000, mas foi noticiado sob a costumeira manchete de Shinjyuu. Embora as vítimas mal se conhecessem, suas histórias não mereceram a continuação da reportagem em dias subseqüentes. Em fevereiro de 2003, outro pacto suicida foi noticiado, e se tornou um marco para os pactos de suicídio pela Internet no Japão, devido à extensa cobertura jornalística. O artigo falava de um jovem e duas mulheres que se encontraram na Internet, e se mataram com gás, usando “briquetes.” O Asahi Sinbun e outros órgãos da imprensa continuaram fazendo reportagens com histórias novas a cada dia. Alguns outros pactos de suicídio com briquetes ocorreram em março, e foram seguidos por incidentes ocasionais do mesmo tipo até os dias atuais.







Sempre houve pessoas desejando estarem mortas, ou tendo pensamentos sobre a morte voluntária. Mas, antes, ninguém os encorajava diretamente a morrer. Nos meios de comunicação convencionais, se alguém diz ou escreve “eu quero morrer,” a resposta mais provável é “Espere, não morra!” Já na Internet, pelo contrário, qualquer um se sente livre para escrever o que quiser sob um nome falso. No momento em que alguém menciona intenções de cometer o suicídio, palavras inventivas aparecem imediatamente e alcançam o candidato ao suicídio. Palavras e expressões horríveis tais como “você é uma porcaria,” “você está morto,” “você não merece viver,” “o mundo estará melhor sem você” começam a se juntar. Estas frases curtas aparecem do nada, e até começam a percorrer páginas genuínas de consulta. No mundo pós-moderno da Internet, as palavras perdem sua ligação ao sujeito responsável por elas. Portanto, as páginas de suicídio pela Internet estão se tornando um campo fértil para o desenvolvimento de todos os tipos de comunicação negativa. Uma das páginas mais populares para a prevenção de suicídios teve que baixar a regra que os usuários só poderiam participar por no máximo meia hora, pra impedir que as emoções negativas se expandissem.







Também, antes da era da Internet, não havia quase nenhuma oportunidade para as pessoas que estavam contemplando o suicídio se encontrassem com outras pessoas com as mesmas idéias. Agora, encontrar companheiros é muito fácil. Em um minuto, os japoneses podem encontrar termos como “eu também quero me matar,” nestas páginas de suicídio. É um novo fenótipo da cultura do suicídio em grupo, com uma nova ênfase na cessação do sofrimento, do medo, do isolamento. É como se, de repente, o suicídio fosse aceitável, desde que fosse praticado junto com outras pessoas, e sem dor. Também é importante observar que, no discurso da mídia, aqueles que recrutaram companheiros raramente tiveram alguma sanção social. Provavelmente porque, uma vez que tal ato é considerado suicídio, ele é, por definição, um ato voluntário entre participantes. E mesmo que não seja, uma vez que os participantes estão mortos, quem vai levar a culpa?






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